Jornada

Parafraseando Belchior: presentemente eu posso me considerar uma mulher de sorte.

Digo, em partes sorte. A outra parte foi muita vontade mesmo.

Lá atrás eu vislumbrei o que estou fazendo hoje. Pensava inocente e silenciosamente comigo: “E SE eu VIVESSE a escalada?” “Será que é possível?” “Será que é loucura?”

Vejam bem, no contexto em que eu estava inserida, viver a escalada parecia bem distante da minha realidade. Eu tinha uma vida comum, bem cartesiana por assim dizer. Aos 24, quando comecei a escalar, já tinha pós-graduação feita e um cargo corporativo que me dava certa segurança financeira. Fora isso, eu nasci e cresci num lugar onde a cultura da escalada praticamente inexiste. Planalto Central, minha gente. O quê que escalador faz no plano? Hahaha Ou seja, compreender o universo desse esporte foi mergulhar no desconhecido.

O tempo passou e a escalada foi criando raízes em mim, ampliando minhas percepções. Meu modo de interagir nesse mundo mudou e eu queria viver mais disso. A pulga atrás da orelha e a formiga na minha cadeira se tornaram intoleráveis. Viver a escalada era algo visceral naquele momento, era só isso que eu queria fazer.

As questões eram muitas: “comecei a escalar muito velha, nunca vou ser boa o suficiente”, “o que eu vou fazer quando minhas economias acabarem?”, “isso é irresponsabilidade”, “ser mulher no mundo outdoor é mais difícil”, “pra onde eu vou?”, “eu vou ter parceria?”.

Mas olha, minha vontade foi e é ainda muito maior que todas essas questões aí (que até parecem meio bobas mesmo). Então o verbo é MANIFESTAR. Manifestar o que você deseja experienciar. E amigx, eu entendi aos trancos e barrancos que viver a vida que você QUER já é resistência nessa sociedade.

Bom, eu pedi demissão e não tinha absolutamente nada planejado. Sei lá, eu ia pra qualquer lugar, Cipó, Canadá, tudo podia ser cenário. Na mesma semana que eu chutei o balde, um amigo me chega com essa proposta:

Ele: “Então, a gente tá indo pra Patagônia filmar um doc de highline e climb, vc quer ir?”

Eu: “LÓGICO”.

Ele: “Mas são 9 homens, você vai ser a única  mulher.

Eu: “Ué, vou completar o time de 10. PARTIU”.

Encarei essa proposta como um claro sinal do Universo que dizia: “Vive, minha filha!” Bom, eu mal sabia montar uma parada e estava indo pra Patagônia, mas né, tudo nessa vida a gente aprende.

Posso dizer que desde então eu tenho vivido sim a escalada. E essas andanças me fizeram chegar até aqui, lugar de onde escrevo essa história. Aqui é o Colorado, EUA, dentro de uma VAN que está sendo meu lar há quase um ano.

É fácil? NÃO MESMO. Nada é. Vai ter perrengue e um monte de lua minguante. Mas me diga uma coisa: se de qualquer jeito vai ter perrengue, porque eu vou viver uma vida que eu não quero ou fazer o que eu não acredito com a força da minha alma? Poisé…

E amanhã? Amanhã pode ser o que eu quiser que seja. Sigo acreditando e aprendendo cada dia mais um tanto. Kmon?

 

2019-07-30T20:01:54-03:00

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